domingo, 28 de fevereiro de 2016

Emicida - Casa


Lá fora é selva
A sós entre luz e trevas
Nós, presos nessas fases de guerra,
Medo e monstros, tipo Jogos Vorazes
É pau, é pedra, é míssil
E crer, é cada vez mais difícil
Entende o negócio: nunca foi fácil
Solo não dócil, esperança fóssil
O samba deu conselhos: ouça
Jacaré que dorme, vira bolsa, amor

Eu disse no começo
É quem tem valor, versus quem tem preço
Segue teu instinto, que ainda é
Deus e o Diabo na terra do sol
Onde a felicidade, se pisca, é isca
E a realidade, trisca, anzol
Corre!

O céu é meu pai
A terra, mamãe
E o mundo inteiro é tipo a minha casa
O céu é meu pai
A terra, mamãe
E o mundo inteiro é tipo a minha casa

Aos quinze, o Saara na ampulheta
Aos trinta, tempo é treta
Rápido como um cometa
Hoje a fé numa gaiola, o sonho na gaveta
Foi pelo riso delas que vim
No mesmo caminho por nós, tipo Mágico de Oz

Meu coração é tamborim, tem voz, sim
Ainda bate veloz
Entre drones e almas, flores e sorte
Se não me matou, me fez forte
É o caos como cais; sem norte
Venci de teimoso, zombando da morte

Sem amor, uma casa é só moradia
De afeto, vazia
Tijolo e teto, fria
Sobre chances, é bom vê-las
Às vezes se perde o telhado, pra ganhar as estrelas
Tendeu?

O céu é meu pai
A terra, mamãe
E o mundo inteiro é tipo a minha casa
O céu é meu pai
A terra, mamãe
E o mundo inteiro é tipo a minha casa

Ah, a gente já se acostumou
Que a alegria pode ser breve
Mostre o sorriso, tenha juízo
A inveja tem sono leve
À espreita, pesadelos
São como desfiladeiros
Chão, em brasa
Nunca se esqueça o caminho de casa


quinta-feira, 25 de fevereiro de 2016

Duppy - Canções de Uma Roma Negra

Capa do álbum Canções de Uma Roma Negra, da banda baiana Duppy.
Uma amiga minha já havia me falado dessa banda há tempos (por sinal, muito obrigado, Camila), mas só conheci a Duppy de verdade no Palco do Rock, evento voltado às mais variadas vertentes do Rock And Roll e que acontece em pleno carnaval de Salvador, só que em um local mais distante dos trios elétricos.

A Duppy é uma banda difícil de rotular, até porque rótulos são desnecessários, na maioria das vezes. Seu som varia do Metal ao Reggae e Ragga, sempre misturando com elementos regionais e contando com a inconfudível presença dos atabaques. O que me chamou mais atenção na banda, além da evidente competência dos músicos, foi o conteúdo de suas letras, grande parte delas abordando os Orixás e a tradicional fé soteropolitana no Sagrado. 

É inspirador ouvir Atotô, Patuá, Xirê Ogum, Festa de Caboclo e foi especial poder gritar Kawó-Kabièsilè num festival de Rock!

Segue abaixo a minha música favorita, que ouço quase todo dia. Canto pra Odoyá é uma amostra do que os caras podem fazer:

Canto para Odoyá

Nas pedras do mar, Aiucá, Janaína
Teu pai Olokun chamou, vem cá
Teu abebé brilhou minha Deusa do mar
Neste sol sagrado, salgado, saudações a ti yá

Igbá! igbá! igbá yê!
Vou no Rio Vermelho, te levo um espelho
Tua beleza é de admirar

Igbá! igbá! igbá yê!
Vou pular as ondas, sem delongas
Meus pedidos vou jogar

E quando o mar me cerca
O arco-íris navega sobre as flores no barco a vela
Tem água de cheiro e de beber
Tem pescador, tem marinheiro
É fevereiro, se queres saber

Ô, dai-me licença aê
Oi, dai-me licença
Alodê, Iemanjá
Ô, dai-me licença

Ô, dai-me licença aê
Oi, dai-me licença
Alodê, Iemanjá

Ô, dai-me licença aê, Aiucá
Dai-me licença aê, Janaína 
Dai-me licença aê, Aiucá

É minha mãe Iemanjá!
É tua mãe Iemanjá!
Nossa mãe Iemanjá!


Você pode ouvir ou baixar o som da Duppy nas seguintes plataformas:

sábado, 13 de fevereiro de 2016

"Você é tão bom quanto qualquer um"


Minha mãe defrontou-se com o velho problema que aflige pais e mães negros nos Estados Unidos: como explicar a discriminação e a segregação a uma criança pequena. Ela me ensinou que eu devia ter a consciência de "ser alguém", mas ao mesmo tempo tinha de sair e enfrentar um sistema que me encarava diariamente dizendo: "você é menos", "você não é igual".

Ela me contou sobre a escravidão e como ela terminou com a Guerra Civil. Tentou explicar o sistema de divisão racial no Sul - a segregação em escolas, restaurantes, teatros, moradias; os cartazes em bebedouros, salas de espera e lavatórios reservando-os para brancos ou pessoas de cor - como uma condição social e não como resultado de uma ordem natural.

Deixou claro que se opunha a esse sistema e que eu nunca deveria permitir que ele me fizesse sentir inferior. E então pronunciou as palavras que quase todo negro tem de ouvir para poder entender a injustiça que as torna necessárias: "você é tão bom quanto qualquer um". Nessa época, mamãe não fazia ideia de que, muitos anos depois, o garotinho em seus braços se envolveria numa luta contra o sistema do qual ela estava falando.

(A Autobiografia de Martin Luther King, p.15-16).

terça-feira, 2 de fevereiro de 2016

Lenda das Sereias - Marisa Monte



Oguntê, Marabô
Caiala e Sobá
Oloxum, Ynaê
Janaina e Yemanjá
São rainhas do mar

Mar, misterioso mar
Que vem do horizonte
É o berço das sereias
Lendário e fascinante

Olha o canto da sereia
Ialaó, oquê, ialoá
Em noite de lua cheia
Ouço a sereia cantar

E o luar sorrindo
Então se encanta
Com as doces melodias
Os madrigais vão despertar

Ela mora no mar
Ela brinca na areia
No balanço das ondas
A paz, ela semeia

Ela mora no mar
Ela brinca na areia
No balanço das ondas
A paz, ela semeia

Toda a corte engalanada
Transformando o mar em flor
Vê o Império enamorado
Chegar à morada do amor

Oguntê, Marabô
Caiala e Sobá
Oloxum, Ynaê
Janaina e Yemanjá
São rainhas do mar






Eu também fui prestar minha solitária homenagem.

Uma pequena homenagem do Ufanisi à Rainha do Mar. Odoyá!
Sobre a tradicional festa do Rio Vermelho, escrevi em 2012 aqui mesmo. Veja o link abaixo:

Odoyá, Iemanjá!