quinta-feira, 20 de novembro de 2014

Agradecer


Hoje, 20 de Novembro de 2014, eu só quero agradecer. Costumamos reclamar, protestar e reivindicar, mas, no calor da batalha, muitas vezes, esquecemos de agradecer às pessoas que possibilitaram que chegássemos até aqui.

Em primeiro lugar, sempre agradeço à minha mãe Maristela e ao meu pai Gilson, por nunca terem nos deixado faltar nada, apesar das grandes dificuldades que enfrentamos várias vezes. Por eu nunca ter passado um ano sequer fora da escola, ou deixado de estudar pra ajudar em casa, como eles tiveram de fazer. Eles me ensinaram que eu devia me esforçar pra ser sempre o melhor que eu pudesse, pois a vida é ainda mais difícil pra nós Negros. Me disseram que eu não podia sair de casa sem camisa ou sem identidade, nem ficar na rua até muito tarde. Que eu deveria evitar entrar em lojas, se não tivesse intenção de comprar, pois os olhares dos seguranças são bastante seletivos.

Agradeço aos que se foram e aos que ainda estão aqui:

Zumbi, Dandara, Ganga Zumba, e por extensão, a todos os quilombos brasileiros. Pessoas que não se submeteram ao poder patriarcal da colonização e resistiram enquanto puderam por uma vida justa e digna. Contra o jugo da escravidão, que transformava reis em prisioneiros.

Malcolm X, Martin Luther King Jr. e todo o Partido dos Panteras Negras, que, mesmo por meios diferentes, muitas vezes, até mesmo antagônicos, denunciaram a violenta segregação racial dos Estados Unidos e buscaram alternativas para que isso não mais ocorresse.

Luísa Mahin, ex-escravizada africana, mãe do abolicionista Luiz Gama e que participou ativamente de vários levantes de escravizados no Brasil do século XIX, como a Revolta dos Malês e a Sabinada, ambas em Salvador, e Maria Felipa, que lutou pela independência do Brasil na Bahia.

Nelson Mandela, uma das minhas maiores referências. O homem que sacrificou a juventude pelo ideal de ver uma África do Sul unida contra o Apartheid.

Abdias do Nascimento, Stuart Hall, Frantz Fanon, William DuBois, Amadou Hampaté Bâ, Elisa Lucinda, Bell Hooks, Angela Davis e toda a intelectualidade Negra mundial, que nos serve de ponto de partida para que tenhamos os elementos  teóricos necessários.

Bob Marley, Tupac Shakur, Racionais MC's, Ilê Aiyê e todas as pessoas que usam a música como manifesto político contra o racismo e as desigualdades sociais.

Mãe Menininha do Gantois, Mãe Stella de Oxóssi, Tia Ciata e todas as Ialorixás do Brasil, mulheres de muita força e coragem, que sustentam a tradição das religiões de matrizes africanas, apesar de todo o racismo travestido de Cristianismo.

Finalmente, a todos os espíritos ancestrais, por permitirem que nos encontremos com nossa própria história todos os dias, e por nos motivar a sair da cama, mesmo sabendo das adversidades que encontraremos pelo caminho. 

Se não fosse pela luta de cada um(a) de vocês, eu não sei se estaria aqui pra escrever isso.

Gill Nguni


segunda-feira, 17 de novembro de 2014

Jogadores Negros podem boicotar a Copa do Mundo da Rússia em 2018

Yaya Touré, jogador da Costa do Marfim e do Manchester City-ING 

Quem primeiro levantou essa bola foi o melhor jogador africano da atualidade, o marfinense Yaya Touré. Vítima de racismo em visita à Rússia para partida pela Liga dos Campeões contra o CSKA Moscou há um ano, o meio-campista do Manchester City falou sobre um boicote de jogadores negros à Copa do Mundo na Rússia, em 2018.


“É um problema real aqui, algo que acontece o tempo todo, e é claro que eles precisam resolver o problema antes da Copa do Mundo. Caso contrário, se não tivermos confiança para ir à Copa do Mundo na Rússia, nós não iremos”, disse Touré em outubro de 2013. Um ano depois, depois de ir a Moscou mais uma vez e de ter lançado sua conta no Twitter, foi alvo de insultos virtuais na rede social.  O jogo foi disputado sem torcida.

Clubes russos têm sido punidos pela Uefa por conta do comportamento de seus torcedores racistas. O CSKA jogou duas partidas com portões fechados nesta Liga dos Campeões. Muito pouco quando se sabe que o racismo no país não será intimidado por punições tão brandas. A Federação do país se cala para o problema mesmo quando a cada rodada do campeonato nacional um novo caso apareça.

O mais recente teve como protagonista o técnico do Rostov, o ucraniano Igor Gamula, que para negar a contratação de um jogador camaronês soltou que “a equipe já contava com jogadores negros suficientes” e que por conta disso “já estava preocupado com o ebola”. A repercussão foi imediata e cinco jogadores negros do clube disseram que não jogariam mais no clube se Gamula não fosse punido.

A federação até puniu Gamula depois de ele pedir desculpas. Ele foi suspenso por cinco jogos do Rostov, uma punição branda e que veio com outra declaração infeliz do técnico. “A imprensa estrangeira simplesmente não entende o humor russo”.  Humor. Os jogadores africanos, infelizmente, não seguiram com a ameaça e entraram em campo no último jogo da equipe no Campeonato Russo.

Fifa Tokyo Sexwale anti racismo Boicote de negros à Copa de 2018? Racismo na Rússia faz Fifa demonstrar temor

A Fifa jura que luta contra o racismo, que não tolera o preconceito, mas faz muito pouco contra federações que são tão coniventes com os racistas. Dentro da entidade, o comitê de luta contra o racismo, está atento. Tokyo Sexwale, sul-africano que lutou com Nelson Mandela contra o apartheid, é consultor da Fifa e apesar de não apoiar um boicote de negros à Copa da Rússia, faz alerta sobre as consequências da não-ação da Rússia contra o racismo.

“A federação russa precisa ser mais séria na luta contra o racismo. A África do Sul foi banida da Fifa durante o apartheid”, lembrou Sexwale, considerando coerente se a Rússia passasse pela mesma sanção. “Há certas partes em Moscou em que se você é da minha cor não é seguro andar. As pessoas estão com medo de ir para Moscou”, completou Sexwale. Ele não defende um boicote à Copa da Rússia, mas diz que se o país seguir fazendo vistas grossas para o problema, o tema não será deixado de lado.
“É um fracasso a Rússia não tomar uma atitude contra o racismo. Poderíamos estar falando algo diferente sobre a Copa do Mundo de 2018, mas se o país não age contra o problema, mais pessoas vão dizer que não vão para a Rússia”, completou Sexwale.

Vladimir Putin, o presidente do país, não faz qualquer sinal de que o país vai lutar contra o preconceito. Basta citar os protestos contra a homofobia que antecederam os Jogos de Inverno em Sochi neste ano. Até atletas do calibre de Yelena Isinbayeva se mostraram tolerantes à lei antigay na Rússia.  Apesar dos protestos de estrangeiros, os Jogos aconteceram sem qualquer ameaça de boicote. O mesmo deve acontecer em 2018, apesar das críticas internacionais.

Seria revolucionário se jogadores negros dessem as costas para a Copa do Mundo de 2018. A Rússia, país que mais apresenta casos de racismo relacionados ao futebol, mereceria um ato dessa magnitude. Mas por falta de união entre atletas, complacência com o sistema e acordos com patrocinadores é difícil imaginar uma ação conjunta neste sentido.


Leia a matéria completa em: Boicote de negros à Copa de 2018? Racismo na Rússia faz Fifa demonstrar temor - Geledés 
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domingo, 9 de novembro de 2014

Ensino da cultura Negra ainda sofre resistência nas escolas


Hoje com 19 anos, Michael Sodré é mais um estudante tenso com as provas do vestibular. Nos primeiros anos do colégio, no entanto, o motivo de tensão era outro. Único garoto negro em sua sala de aula, em um famoso colégio de elite na zona sul do Rio de Janeiro, o menino era alvo frequente de bullying por parte dos colegas.
"Chamavam ele de Bombril por causa do cabelo", disse a mãe adotiva, Celina Sodré. Em uma conversa dura com a coordenadora da escola, o diálogo acabou em uma recomendação insólita:
"Ela simplesmente me disse que a solução do problema era que meu filho fosse estudar na escola pública, porque ai ele saberia onde era o seu lugar".
Cenas de bullying por parte dos colegas e racismo por parte do próprio sistema se reproduzem em escolas de todo o Brasil. Mais de um século após o fim da escravidão, o país que mais recebeu trabalhadores negros ainda trata esses cidadãos como se fossem subalternos, segundo especialistas ouvidos pela reportagem.
A lei 10.639, promulgada em 2003, foi criada justamente com o intuito de valorizar as raízes africanas do país e superar o racismo.
"É preciso superar a visão do negro apenas como escravo. É assim que ele geralmente aparece nos livros escolares", conta Rafael Ferreira da Silva, Coordenador do Núcleo de Educação Étnico-Racial da Secretaria Municipal de Educação de São Paulo.
A prefeitura paulistana fez neste ano um levantamento inédito na rede de ensino da cidade para ver o alcance da aplicação da lei.
"O levantamento mostrou que há avanços. Mais da metade das escolas trabalham o tema. Mas na maior parte dos casos, é geralmente iniciativa isolada de um professor que gosta do tema. E também há o problema da descontinuidade. Se o professor deixa a escola, muitas vezes o assunto deixa de ser abordado", disse.

Mitos aceitos e mitos ocultos

"Discutir África não é coisa fácil nas escolas", diz Stela Guedes Caputo, pesquisadora do tema e professora na UERJ (Universidade Estadual do Rio de Janeiro).
Além dos casos concretos de preconceito registrados em sala de aula, ela diz que quando a lei é cumprida, há casos em que "pais se reúnem com os filhos e vão à escola questionar e criticar professores que querem discutir a história da África".
Stela também questiona a ausência de elementos de origem afro nos livros escolares. A questão se torna especialmente delicada quando se tratam de personagens ligados às religiões afro-brasileiras.
Nesse caso, a ocultação desse capítulo da cultura nacional não é apenas prerrogativa das escolas. Em muitos casos, as próprias crianças escondem a religiosidade para não sofrerem preconceito por parte dos colegas.
"Os mitos que as crianças aprendem nos terreiros de candomblé não são aceitos na escola, os itans (os mitos da cultura iorubá), as histórias africanas que conhecem, são das mais belas criações literárias humanas e elas precisam escondê-las. Seu conhecimento é negado. Porque na escola é tão comum mitos gregos, romanos e outros, e mitos africanos são demonizados?", questiona.

Avanço

Livro Minas de Quilombos
Editais do MEC exigem que livros didáticos tenham conteúdo sobre a história afro-brasileira
Professora de formação, Macaé Maria Evaristo do Santos conta que há mais de dez anos, quando ainda dava aula em um colégio de Belo Horizonte (MG), a visiblidade da cultura afro-brasileira era bem menor.
"Uma vez cheguei em uma sala do Ensino Médio e perguntei aos alunos quantos haviam lido um livro com personagens negros. Alguns levantaram a mão. Depois de mais de dez anos de escolaridade, eles citaram a Tia Nastácia, o Saci Pererê, o Negrinho do Pastoreio… Nem Zumbi dos Palmares fazia parte do repertório", conta.
Macaé hoje é Secretária de Educação Continuada, Alfabetização, Diversidade e Inclusão do Ministério da Educação (MEC). Uma década após a promulgação da lei, ela ainda vê desafios, mas comemora os resultados.
"Essa é uma temática que vai ganhando relevância. Antes só se falava nisso no Dia da Consciência Negra. Aos poucos vai se integrando no projeto pedagógico das escolas", diz.
A secretária conta que em 2012, o curso mais solicitado pelos diretores de escolas do país na Rede Nacional de Formação Continuada do MEC foi justamente o que capacita professores para o ensino de cultura afro-brasileira.
Na última década, os editais para o desenvolvimento de livros didáticos financiados pelo MEC também exigem esse conteúdo.
Fonte: BBC Brasil

quinta-feira, 6 de novembro de 2014

A negação do preconceito


O Brasil é um país racista. Que ninguém esqueça disso.

Combate ao racismo no Brasil esbarra na negação do preconceito
Brasília – Um estudo realizado pela Universidade de São Paulo (USP) em 1988, em ocasião do centenário da Abolição da Escravatura, questionou aos entrevistados: “Você tem preconceito?” e “Você conhece alguém que tem preconceito?”. Em resposta à primeira pergunta, 96% da população disse não; à segunda, 99% dos pesquisados responderam sim. Conclusão: “todo brasileiro se sente uma ilha de democracia racial, cercada de racistas por todos os lados”. A frase, atribuída à antropóloga Lilia Schwarcz, 57 anos, dá a dimensão do desafio no enfrentamento da discriminação em razão da cor da pele. Racismo, portanto, é o tema a ser abordado pelo Ministério Público do Trabalho (MPT), na semana entre 3 e 9 de novembro, como parte da campanha do Mês da Consciência Negra.
“O conceito de raça vem sendo questionado desde o pós-guerra, e há hoje um entendimento de que a única raça existente é a raça humana. No entanto, sociologicamente, as pessoas ainda são diferenciadas pelo fenótipo e pela origem. Em função disso, as pessoas são discriminadas. Inclusive, algumas ideias que imaginávamos já superadas, como a de superioridade física de um grupo a outro, persistem e são externadas pela população”, explica o professor Ivair Augusto dos Santos, do Centro de Convivência Negra (CCN), da Universidade de Brasília (UnB).
Na opinião da coordenadora de projetos do Centro de Referência do Negro (Cernegro), Lucimar Martins, não há democracia racial do país. “Essa falácia de que o Brasil é uma democracia racial cai por terra quando a Constituição Federal é promulgada, em 1988. O próprio texto criminaliza o racismo. Como poderíamos criminalizar o racismo caso ele não existisse?”, questiona.
Segundo ela, uma das formas de sensibilizar a população é dar destaque às atitudes racistas para poder combatê-las. “É importante focar na discriminação racial, que é a materialização do racismo, o próprio ato de discriminar. É preciso partir da premissa que o racismo é uma realidade para poder enfrentar a questão”.
Racismo e racismo institucional – O conceito de racismo é entendido não somente como a conduta discriminatória em razão da cor da pele, mas também em decorrência de raça, religião, etnia ou procedência nacional. “Hoje o conceito de racismo foi desdobrado e chegou-se ao chamado racismo institucional. É o caso de servidores que, investidos de cargo público, atendem de forma diferenciada um negro ou um homossexual, por exemplo. Estamos falando das consequências desse racismo nos órgãos públicos, de como essa prática é utilizada para excluir pessoas e negar direitos”, argumenta a Lucimar Martins.
Campanha – Durante o mês de novembro, MPT realiza a campanha Mês da Consciência Negra para a efetivação da igualdade racial no Brasil. Ao todo serão abordados quatro temas: raça e racismo (3 a 9), violência contra negros (10 a 16), discriminação no ambiente de trabalho (17 e 23) e cotas raciais (24 e 30). A campanha, que conta com o apoio do Grupo Nacional de Direitos Humanos (GNDH), será divulgada nas redes sociais, TV aberta e rádio.
Fonte: Ministério Público do Trabalho

sábado, 1 de novembro de 2014

Mês da Consciência Negra. Onde está a sua?

Pela valorização das populações Negras

Começamos novembro e, a partir de hoje, várias ações serão realizadas em homenagem a Zumbi, um dos maiores líderes do Quilombo dos Palmares, em Alagoas, que foi assassinado em 20 de novembro de 1695.

É um período necessário de reflexões, em que as temáticas em prol das populações Negras entram em evidência, mais do que no decorrer do ano. É o único feriado dedicado a um mártir Negro no Brasil, repleto de feriados católicos ou "cívicos". Mesmo assim, ainda alvo de controvérsias, pois vários estados o tratam como um mero ponto facultativo, e outros fingem que esta data não existe.

É um movimento necessário para que possamos denunciar com mais força o racismo e o sexismo a que as populações Negras são submetidas, desde sua chegada nada amistosa à colônia portuguesa na América até os dias tenebrosos do século XXI.

O Novembro Negro é um ato político, para mostrar a todas as pessoas, independentemente da cor de sua pele ou classe social, que muitas coisas ainda estão erradas no mundo inteiro, apesar dos avanços que conquistamos nas últimas décadas. Que ainda não chegamos ao topo da escada, mas já começamos a subir os degraus.

Convém lembrar, como faço todo ano, que a Consciência Negra não se restringe ao mês de novembro. Muitas ações são realizadas o ano inteiro, mas convergem para este período pela carga simbólica que ele carrega. E que o principal foco das celebrações do Novembro Negro pelo país é a luta contra o racismo, nas suas mais variadas formas. O racismo é um problema social, pertence a todos nós.