quarta-feira, 5 de setembro de 2018

Colin Kaepernick renova contrato com a Nike e volta a causar "polêmica"

"Acredite em algo. Mesmo que isso signifique sacrificar tudo."
Por Gill Nguni

É incrível como as mesmas pessoas que menosprezam constantemente a luta antirracista, tanto no Brasil como nos Estados Unidos, escondendo-se na falácia do "somos todos iguais", passam a sentir na pele quando não se veem representadas. Deve ser muito difícil ver uma grande empresa lançar uma peça publicitária sem um personagem branco como centro das atenções, né?

Colin Kaepernick voltou a ser assunto (para os brancos, pelo menos) após a Nike o anunciar como garoto-propaganda da sua famosa campanha "Just Do It", que está completando 30 anos. Desde o anúncio extraoficial, celebridades como LeBron James e Alicia Keys, por exemplo, manifestaram apoio em suas redes sociais, mas, no sentido oposto, surgiram inúmeras reações raivosas de consumidores brancos, revoltados com a escolha da empresa.

Pra quem não lembra, Colin Kaepernick foi jogador do San Francisco 49ers, time da NFL - principal liga de futebol americano, que se ajoelhou durante a execução do Hino Nacional dos EUA antes das partidas, protestando contra os constantes assassinatos de Negros pela polícia, fato que também é bastante comum aqui no Brasil, embora nenhum atleta tenha coragem suficiente pra se posicionar de maneira tão incisiva (Veja AQUI). 
“Eu não vou me levantar e mostrar orgulho pela bandeira de um país que oprime os negros e pessoas de cor. Para mim, isso é mais importante que futebol e seria egoísta da minha parte virar a cara. Há corpos na rua enquanto os responsáveis recebem licença remunerada e ficam impunes por assassinatos.”


Os protestos de Kaepernick lhe custaram sua permanência na NFL, já que muitos times o evitaram, por medo de receberem as polêmicas no mesmo pacote ou por mero boicote mesmo. Inclusive, o ex-jogador do 49ers está processando a liga pelo que aparenta ser uma represália, pois sua manifestação solitária foi recebendo cada vez mais adesão, até entre os jogadores adversários, chegando também a outros esportes, como a NBA (principal liga de basquete), no atletismo e no futebol dentro e fora do país.

Ao renovar o contrato com Colin Kaerpernick, assinado desde 2011 e que já estava próximo do fim, a Nike entrou forte na briga midiática e resolveu encarar a forte onda "conservadora" (um bom eufemismo pra racista) no país, representada pelo próprio presidente dos Estados Unidos, Donald Trump, que sempre se manifesta no Twitter contra qualquer atleta Negro que mostre algo além do mero entretenimento. Tal postura, inclusive, o deixou numa saia justa ao final da NBA na temporada 2017-2018, quando ambos os times finalistas - o Cleveland Cavaliers de LeBron James e o Golden State Warriors de Stephen Curry - recusaram a tradicional visita à Casa Branca após o título, independentemente de quem vencesse o campeonato. Trump representa uma legião de doentes que está cada vez maior no mundo. Pessoas postaram vídeos queimando roupas e tênis da Nike, em represália à escolha da empresa, e as ações caíram cerca de 3% nesta terça pós-anúncio.

O sistema tenta se proteger de todas as formas, fazendo o possível para que nada mude. Não que a Nike seja uma empresa virtuosa, solidária e defensora dos direitos humanos, longe disso, mas nada justifica reações tão simbolicamente violentas quanto a que estamos vendo nestes anos de radicalização das relações interpessoais. Manifestar uma opinião  tornou-se algo muito perigoso, e sair do "padrão" típico - homem, branco, cristão, heterossexual - na mídia é um ato de coragem. É um trabalho que todxs nós temos de fazer, cada umx à sua maneira. Mesmo que isto signifique sacrificar tudo.